Uma noite turbulenta na Amazônia

Turbulência atmosférica

Quando se imagina uma noite limpa e estrelada nos trópicos, a provável imagem que vem à mente é a de um ar calmo, em paz, salvo talvez por uma brisa leve. E embora isso possa não estar errado por completo, é apenas uma parte da história. A atmosfera nunca fica parada. Sempre há movimento e o que percebemos como uma brisa suave pode, na verdade, ser um fluxo de ar bastante turbulento.

Olhando para a torre alta, com um céu escuro e estrelado atrás dela.
Uma noite estrelada na ATTO. © Andrew Crozier / MPI-C

Em um novo estudo, Polari Corrêa, Cléo Quaresma, Luca Mortarini e os outros coautores analisaram a dinâmica atmosférica dentro e acima do dossel da floresta durante uma noite específica no ATTO. É importante entender melhor essas dinâmicas, pois elas auxiliam na compreensão de como gases, partículas e energia são transportados e intercambiados entre a floresta e a atmosfera sobrejacente. Por exemplo, uma atmosfera demasiada estratificada impedirá processos de troca, enquanto estruturas turbulentas, por outro lado, facilitarão tal troca. Portanto, entender a dinâmica atmosférica também significa entender melhor a troca entre biosfera e atmosfera.

Uma noite na Amazônia

A noite que a equipe estudou aconteceu durante a transição da estação de chuvas para a de secas em novembro de 2015. A equipe coletou dados em uma janela de 12 horas, entre 19h, logo após o pôr do sol, e 7h, logo após o nascer do sol.

A primeira parte da noite, até as 23h, foi de muitos ventos com intensa turbulência atmosférica sobre a floresta. Eles foram gerados pela superfície áspera do dossel irregular. Dentro do dossel, no entanto, as árvores agiram para reduzir de forma drástica a velocidade dos ventos, tornando as condições muito mais calmas no solo.

Perto da meia-noite, a direção do vento oscilou por um tempo, enquanto a velocidade do mesmo diminuiu até que o ar ficou quase parado em todas as alturas. Esta segunda parte da noite foi caracterizada por algo chamado de onda de gravidade. Quando a atmosfera é estratificada de forma estável e o vento sopra de forma ortogonal em direção a uma crista de morro, a interação entre o fluxo e a orografia gera oscilações verticais que se propagam na atmosfera (ondas orográficas de gravidade).

Mas a noite não ficou calma por muito tempo. Após 1h, os ventos voltaram a soprar em uma camada rasa acima do dossel com baixas velocidades de vento nas camadas superiores. Isso marca o início de um jato de baixo nível, uma faixa de ar em movimento rápido nos baixos níveis da atmosfera. O vento veio do sudoeste, na direção do Rio Uatumã. Mais acima na atmosfera, os ventos vieram de outras direções, a 150m do sudeste e a 325m do leste. Mas ao longo da noite todos os ventos mudaram para se alinharem com a camada inferior. O jato de baixo nível teve um grande impacto na dispersão escalar acima e dentro da floresta.

Os cientistas levantaram a hipótese de que o Rio Uatumã e o relevo acidentado seriam a causa da formação do jato. As ondas de gravidade no início da noite também podem tê-lo desencadeado.

Simulação 3D da topografia da área ao redor da ATTO, com o rio Uatuma e o planalto em que se situa a estação. © Luca Mortarini

As observações de Polari Corrêa, Cléo Quaresma, Luca Mortarini e dos outros coautores durante esta noite destacam a complexa dinâmica e mecanismos na atmosfera acima de uma floresta densa. Eles também mostram que precisamos de mais conjuntos de dados e mais extensos para entender ainda melhor esses processos, pois essas dinâmicas afetam o transporte de gases e partículas dentro e acima da floresta.

Eles publicaram o estudo “Um estudo de uma onda gravitacional induzida pela orografia da floresta amazônica e geração de jatos de baixo nível” na revista Agricultural and Forest Meteorology.

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Em um novo estudo, Luca Mortarini e seus colegas apresentam uma nova abordagem para o estudo da subcamada de rugosidade, usando um modelo de orçamento cospectral. Sua originalidade está em não considerar a analogia da camada de mistura para parametrizar as estatísticas de turbulência. Além disso, ele as relaciona com as diferentes escalas do espectro de velocidade do vento sem fazer nenhuma suposição sobre a propriedade do fluxo.

Eiky Moraes, Cléo Dias-Júnior e seus colegas queriam descobrir se a topografia local no ATTO influenciava os movimentos atmosféricos. Em particular, eles estavam interessados no efeito que a topografia tem sobre a formação de ondas gravitacionais. A comparação de duas simulações, uma com e outra sem topografia, revelou algumas diferenças importantes na dinâmica e na química da atmosfera.